Obesidade atinge nível recorde no Brasil e impulsiona cirurgias bariátricas
O número de pessoas com obesidade no Brasil chegou a 9 milhões em 2024. É o maior índice já registrado desde 2020, conforme um levantamento inédito realizado pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), do Ministério da Saúde, divulgado pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM).
O avanço da doença no País reflete diretamente no aumento do número de cirurgias bariátricas realizadas nos últimos anos. De acordo com a SBCBM, entre 2020 e 2024, foram contabilizados 391.731 procedimentos.
A indicação para a realização do procedimento é bastante rigorosa e contempla indivíduos com índice de massa corporal (IMC) a partir de 40, ou de 35 quando há comorbidades relacionadas à obesidade. “Os critérios incluem várias tentativas fracassadas de perder peso por meio de métodos não cirúrgicos e um compromisso com mudanças no estilo de vida após a cirurgia”, afirma o especialista em cirurgia bariátrica Roberto Luiz Kaiser Júnior, da Kaiser Clínica.
Entre os diversos benefícios, o médico ressalta que a cirurgia bariátrica pode contribuir para a redução da mortalidade geral, diminuir o risco de desenvolvimento de câncer no futuro e reduzir significativamente as complicações associadas a doenças cardiovasculares. “A principal aliada nesse processo é a melhora da síndrome metabólica, que impacta diretamente condições como hipertensão arterial, diabetes tipo 2 e apneia do sono, podendo, em alguns casos, levar até à remissão dessas doenças”, explica.
A cirurgiã do aparelho digestivo e especialista em cirurgia bariátrica da Clínica Sivieri, Giovana Rossi, destaca que os benefícios da perda ponderal promovida pelo procedimento também incluem o alívio de dores articulares e de hérnias de disco, a melhora de quadros de refluxo gastroesofágico e incontinência urinária, além do controle do colesterol e da contenção da progressão da esteatose hepática. Outro impacto positivo está relacionado à fertilidade: “Muitas mulheres que não conseguiam engravidar antes da cirurgia bariátrica realizam esse sonho depois do procedimento”, destaca.
De acordo com o cirurgião do aparelho digestivo e especialista em cirurgia bariátrica Henrique Gandolfi, da Clínica Gandolfi, pacientes com obesidade grave ou mórbida apresentam um risco de morte até 12 vezes maior entre os 30 e 40 anos, em comparação com indivíduos que não são obesos. “A obesidade também eleva o risco para alguns tipos de câncer, como os de intestino, próstata e mama. Ao perder peso, o paciente deixa esse grupo de risco”, afirma.
Atualmente, a medicina conta com diferentes técnicas de cirurgia bariátrica, mas duas se destacam mundialmente tanto pela eficácia quanto pela frequência de indicação: o bypass gástrico, também chamado como gastroplastia em Y de Roux, e a gastrectomia vertical, conhecida como sleeve.
“O bypass apresenta um controle de médio prazo mais eficaz das doenças metabólicas (triglicérides e colesterol altos, diabetes e hipertensão), com a desvantagem de exclusão do trânsito alimentar do duodeno e o jejuno proximal, o que dificulta a absorção de ferro, cálcio e alguns outros oligoelementos, que devem ser repostos e monitorados”, explica o cirurgião bariátrico Henrique Gandolfi. “A sleeve é uma cirurgia que não exclui esses segmentos intestinais do trânsito, causando menor alteração na fisiologia do trato digestivo e facilitando o controle de vitaminas e oligoelementos. Como desvantagem, pode estar associada à ocorrência de refluxo gastroesofágico no pós-operatório.”
Independentemente da técnica escolhida, os especialistas são unânimes em afirmar que a cirurgia, por si só, não faz milagres. Mudanças no estilo de vida são indispensáveis para garantir o sucesso do procedimento a longo prazo.
“A cirurgia é um instrumento potente que auxilia o paciente no processo de emagrecimento, mas existe o risco de reganho de peso se as orientações médicas sobre alimentação e hábitos de vida não forem seguidas. Por isso, a adesão contínua às recomendações é fundamental”, alerta o cirurgião bariátrico Roberto Luiz Kaiser Júnior.
No pós-operatório, a alimentação passa por uma reeducação gradual. Nos primeiros meses, há uma série de restrições, tanto em quantidade quanto em qualidade, até que o paciente seja liberado para retomar a dieta geral, sempre com acompanhamento nutricional. “Alguns alimentos hipercalóricos como os muito ricos em carboidratos, açúcar, gorduras, bebidas alcoólicas devem ser consumidos com moderação”, orienta a cirurgiã bariátrica Giovana Rossi.
Existem seis tipos de procedimentos invasivos oficialmente reconhecidos pelo Conselho Federal de Medicina para o tratamento da obesidade:
Balão intragástrico
Gastrectomia vertical (sleeve)
Bypass gástrico
Derivação biliopancreática
com gastrectomia horizontal (cirurgia de Scopinaro)
Derivação biliopancreática
com gastrectomia vertical
(duodenal switch)
Banda gástrica ajustável
Além desses, também há outras cirurgias sendo realizadas no Brasil e no mundo, cujos resultados já foram descritos na literatura científica, mas que ainda não
foram ratificadas pelo CFM.
Fonte: Especialista em cirurgia
bariátrica Henrique Gandolfi
Índice de Massa Corporal (IMC) igual ou superior a 40, ou a partir de 35 quando associado a comorbidades como hipertensão arterial, diabetes tipo 2, dislipidemias (níveis elevados de triglicérides e colesterol) e apneia do sono, entre outros
Ter tentado, sem sucesso, métodos tradicionais para perda de peso, como dietas, atividade física, medicamentos e acompanhamentos clínicos
Ter comprometimento com mudanças no estilo de vida após a cirurgia, incluindo alimentação equilibrada, atividade física regular e acompanhamento
médico contínuo
Realizar uma avaliação pré-operatória completa e multiprofissional, que inclua exames laboratoriais e de imagem, para que se
possa reduzir ao máximo qualquer intercorrência
Receber orientações detalhadas sobre o procedimento cirúrgico e os cuidados no pós-operatório
Fonte: Especialistas em cirurgia bariátrica Giovana Rossi, Henrique Gandolfi e Roberto Luiz Kaiser Júnior
Complicações de curto prazo que podem ocorrer nos primeiros 30 dias após a cirurgia bariátrica:
Mortalidade: cerca de 0,5%
Fístula: 0,5% a 1% - Ocorre quando a linha de grapeamento ou as anastomoses (junção do intestino com o estômago ou entre alças intestinais) não cicatrizam corretamente, causando vazamento de conteúdo intestinal para a cavidade abdominal
Embolia pulmonar: 0,5% a 1%
Sangramento: 3% a 4%
Complicações de longo prazo, especialmente quando não há acompanhamento médico adequado: Déficits nutricionais, principalmente anemia e deficiência de vitaminas do complexo B
Fonte: Especialista em cirurgia bariátrica Henrique Gandolfi