Você não precisa fazer terapia
Eu não vou dizer que você "precisa" fazer terapia, não é sobre isso. Mas quero te convidar a imaginar algo: como teria sido sua infância se você tivesse aprendido desde cedo a lidar melhor com suas emoções e pensamentos? Se tivesse sido ensinado a acolher o que sentia, a compreender suas angústias e a expressar suas necessidades de forma clara e saudável?
Agora pense nos seus pais. Eles também foram crianças, passaram por desafios e, muitas vezes, carregaram para a vida adulta dores que nunca tiveram a chance de curar. E essas dores, de um jeito ou de outro, chegaram até você. Imagine, por um momento, se eles tivessem tido acesso à terapia desde pequenos e tivessem aprendido a amar e se relacionar de formas mais leves, mais conscientes.Talvez houvesse mais diálogo e menos silêncio nas horas difíceis.
Considero valioso imaginarmos o quanto ganharíamos emocionalmente se nossos pais tivessem sido pessoas felizes. Não digo pais melhores, ao contrário, considero dizer às pessoas imaginarem até, que seriam pais "menos presentes" mas que fossem felizes.
Essa é uma reflexão profunda. Muitas vezes, associamos a qualidade parental a comportamentos como presença, suporte financeiro ou dedicação, mas raramente refletimos sobre a influência da felicidade autêntica na dinâmica familiar.
Certamente teríamos um ambiente emocionalmente mais saudável, mesmo que fossem menos atenciosos em aspectos práticos. A felicidade genuína contamina as pessoas, assim como a tristeza e o ressentimento o fazem. Um lar feliz cria um espaço de segurança emocional, onde os filhos podem crescer com mais liberdade para explorar quem são.
Imaginar como seria se nossos pais fossem simplesmente felizes é também um convite para percebermos o valor da autenticidade emocional, acima das convenções ou dos sacrifícios idealizados.
Os benefícios são amplos. Se a terapia fizesse parte da nossa formação desde cedo, aprenderíamos a identificar nossas emoções sem medo ou vergonha. Sem tanto sentimento de rejeição.
As frustrações por não conseguirmos algo ou a tristeza por perdermos uma amizade seriam vistas como partes naturais da vida, e não como sinais de que há algo errado com a gente. Cresceríamos com mais clareza sobre quem somos, com mais confiança para enfrentar os desafios e menos necessidade de agradar os outros à custa de nós mesmos.
Imagine uma infância onde, em vez de gritos e desentendimentos, as famílias conversassem de verdade, onde cada membro pudesse ser ouvido e acolhido. O afeto fluiria de forma mais espontânea, e o peso das expectativas diminuiria.
Nós seríamos adultos menos ansiosos, menos inseguros, e, provavelmente, mais presentes e conectados uns com os outros.
Viveríamos em uma sociedade menos reativa e mais empática. Saberíamos escutar antes de julgar, compreender antes de criticar. Ainda assim o mundo não seria perfeito, mas seria mais humano.
Pensar nisso é importante, não para lamentar o que não foi, mas para reconhecer o que ainda pode ser transformado a partir de agora.
Então não vou dizer que você “precisa” de terapia, mas imagine só como seria se todos nós tivéssemos tido esse espaço desde o começo. Um espaço para sermos ouvidos, entendidos e, principalmente, cuidados.
Karina Younan
Psicoterapeuta, mestre em ciências da saúde pela Famerp, mãe de artista e apaixonada pela vertente
fenomenológica existencial
@kayounan