Uma vida em viagens e histórias
Conhecido por suas reportagens de viagens e vasta experiência na comunicação, o jornalista, apresentador e escritor Zeca Camargo esteve em Rio Preto na última semana como convidado especial da inauguração do novo espaço da Azem Turismo, que celebra seus 30 anos como referência no setor de viagens.
Os empresários Sérgio Azem e Henrique Cruz, à frente da agência, destacam que a mudança para o novo endereço faz parte da missão de aprimorar ainda mais o atendimento personalizado, um dos pilares da empresa. “A celebração dos 30 anos da Azem Turismo reforça seu compromisso com a qualidade e inovação no turismo, consolidando sua trajetória de sucesso e credibilidade no mercado”, afirmam.
Zeca atendeu a Bem-Estar para uma entrevista agradável sobre sua carreira e viagens, nas quais já conheceu 117 países. “Eu brinco que ainda faltam 80 para conhecer todos os países do mundo”, diz Zeca. Confira a entrevista:
BE – Zeca você é jornalista, apresentador, escritor e roteirista. Ganhou notoriedade na TV Globo, onde ficou por 25 anos à frente de programas renomados como o “Fantástico”, “No Limite” e “Vídeo Show”, além das coberturas internacionais. O que mais te marcou de todas essas experiências?
Zeca Camargo – Os anos que passei no programa Fantástico foram, sem dúvida, os mais significativos em minha trajetória de aprendizado profissional. Embora já tivesse experiência em televisão desde minha passagem pela MTV no início dos anos 90, foi na TV Globo que meu olhar de jornalista e, sobretudo, minha formação como apresentador se consolidaram. A gente brincava e, tenho a impressão de que eles continuam falando disso até hoje, que o Fantástico estreava todo domingo, ou seja, todo domingo você tinha um programa novo para encantar, para seduzir, para informar e para mostrar o que estava acontecendo no mundo. Isso me proporcionou valiosas lições. Cada nova reportagem ou programa torna-se uma oportunidade de oferecer ao público algo diferente e interessante, equilibrando o informativo com entretenimento, de maneira séria e com credibilidade.
Claro que adorei fazer o “No Limite”, talvez foi uma das coisas mais excitantes que eu fiz em muito tempo, porque a gente não sabia o que ia acontecer, não tínhamos noção de que aquilo seria um sucesso. O programa tinha um mistério que era bacana. Mas ao longo dos anos, o Fantástico mostrou a experiência mais duradoura e, talvez, a mais influente para mim.
BE – De que maneira sua carreira como apresentador e jornalista influenciou sua experiência como escritor?
Zeca Camargo – Como eu costumo dizer, meus primeiros livros eram, na verdade, grandes reportagens transcritas num formato diferente. Sempre gostei de escrever, eu comecei no jornalismo escrevendo, na Folha de São Paulo, ainda no final dos anos 80, mas esse exercício de olhar para as reportagens que eu estava fazendo e transformá-las numa narrativa que cativasse o leitor foi algo que eu realmente aprendi.
Então, tenho muito desse olhar jornalístico em meu primeiro livro, “A Fantástica Volta ao Mundo”, que foi um grande relato de viagem, que tinha, obviamente, alguma coisa mais pessoal, com depoimentos e um pouco de bastidores, que é o que eu acho que as pessoas gostam de saber quando elas já viram uma série ou já viram uma reportagem na TV.
O primeiro exercício foi de não só descrever o que eu tinha visto e vivido, mas também de acrescentar com alguns detalhes que a televisão, por mais que seja competente, talvez, não conseguisse mostrar, sobretudo, o meu lado mais pessoal, o meu envolvimento com as viagens, com as reportagens para as pessoas que eu encontrava.
Quando fiz o livro da Elza Soares encarei como uma grande entrevista, claro que uma biografia é muito mais do que uma entrevista. Eu acabei tendo mais de 50 horas de entrevista com a Elza Soares para poder fazer essa biografia, que modéstia à parte, é um dos meus melhores trabalhos em livro. Depois tem o esforço de tornar aquilo uma narrativa só, coerente, que também eu peguei emprestado um pouco da televisão.
BE – Seu livro “A Fantástica Volta ao Mundo” fala sobre uma jornada por diversos países. O que mais te marcou? De que forma essa experiência mudou sua leitura sobre o mundo?
Zeca Camargo – Foram quatro meses e meio viajando pelo mundo e eu não tenho dúvida de que a maior lição foi, justamente, aprender a conviver com culturas tão diferentes. Pelo ritmo da viagem, na qual eu tinha que mandar uma reportagem a cada semana, passava por um, às vezes, dois países na mesma semana, conhecer pessoas interessantes, entender um pouco daquela cultura e depois transformar aquilo numa série. Tinha que me adaptar muito rápido a várias diferenças culturais. Embora o início tenha sido desafiador, gradualmente compreendi a importância de manter uma mente aberta diante das diferenças culturais, abandonando a mentalidade de imposição de minha própria cultura. Ao percorrer 16 países em um curto período, reafirmei uma lição fundamental: o verdadeiro viajante deve ser receptivo e atento, buscando aprender com as experiências locais. A riqueza das diversidades culturais é, sem dúvida, um aspecto vital que enriquece nossa convivência e torna o mundo um lugar mais vibrante.
BE – Um dos seus livros é sobre lugares considerados Patrimônios da Humanidade. Como você acredita que essas obras ajudam a preservar as histórias e culturas de cada local?
Zeca Camargo – A ideia de fazer uma volta ao mundo pelos patrimônios da humanidade veio do sucesso da primeira volta ao mundo e a gente percebeu que tinha uma curiosidade muito grande das pessoas de conhecer essas culturas diferentes. Neste novo projeto, decidimos dar ênfase às culturas ameaçadas, direcionando nosso olhar às listas da Unesco, que catalogam não apenas as localizações mais renomadas, mas também aquelas em risco de desaparecimento. Um exemplo marcante dessa jornada foi a visita a Txantxan, no Peru, uma antiga cidade costeira que, devido à ação das forças naturais, enfrenta um processo de deterioração constante. Da mesma forma, a cidade de Timbuktu, no Mali, com suas mesquitas ancestrais feitas de barro, se reergue anualmente após ser abordada pela destruição, simbolizando a resiliência da fé e da comunidade. Tal experiência reforça a importância do respeito pela cultura e nos incita a adotar uma postura proativa na preservação desses legados históricos. O relato dessas vivências, compilado em meu livro "A Fantástica Volta ao Mundo", não só me permitiu explorar em profundidade as emoções envolvidas, mas também compartilhar uma visão mais ampla sobre a necessidade de um mundo culturalmente diverso e vibrante, que respeite suas raízes e promova a recuperação dos patrimônios que ainda nos conectam ao passado.
BE – Você se sente privilegiado por todas essas experiências ao redor do mundo?
Zeca Camargo – Eu já conheço 117 países, mas eu brinco que ainda faltam 80 para conhecer todos os países do mundo e eu falo sim em tom de brincadeira, mas também é como uma missão, acho que eu não vou entender esse mundo, as diversidades dele, a riqueza dele, justamente se eu não tiver na minha missão como viajante a oportunidade de conhecer cada um desses países, cada uma dessas culturas. Então sim, bastante privilegiado, porque desde a infância eu brinco que tive pais que colocavam eu e meus irmãos "para fora de casa", no sentido de que eles apostavam numa viagem - não como um luxo, mas como um aprendizado, uma riqueza. A gente sempre tinha essa missão de aprender alguma coisa nas viagens e eu levo esse pedido dos meus pais até hoje em qualquer país diferente que eu visito. Agora brinco que faltam só 80, mas dá um gás aí. Poder tornar isso não apenas um privilégio, mas um conhecimento, um acervo, uma bagagem sem trocadilhos para que isso torne a minha vida e a vida das pessoas que lerem as minhas aventuras mais interessante.
BE – Além dos legados culturais, o que mais te chamou a atenção durante esses roteiros: as pessoas que você teve a oportunidade de conhecer e conversar, as diversas línguas faladas, as gastronomias típicas ou a diversidade de maneiras de viver, de pensamentos, ideais e vivências que compõe esse mundo que vivemos?
Zeca Camargo – Até parece um pouco curioso, mas justamente o que eu aprendi nessas viagens todas é que quanto mais a gente é diferente, mais a gente é parecido. Eu, realmente, estive em cinco continentes, nesses 117 países eu vi pessoas que têm outras religiões, que têm outros modos de se vestir, a própria educação das crianças e adolescentes acontece de outras maneiras, a estrutura social é diferente, a maneira como as cidades são organizadas é diferente. Se você quiser se pegar nos detalhes, você tem praticamente um mundo diferente a cada esquina, muitas vezes dentro do mesmo país. Na Índia, por exemplo, há uma diversidade linguística, as crenças variadas, os estilos de vida distintos e as diferentes expressões arquitetônicas constituem um rico mosaico cultural. Contudo, ao invés de se concentrar nas particularidades que atraem a atenção imediata, como a gastronomia, os aromas ou as paisagens cativantes, é a universalidade dos desejos humanos que realmente se destaca. As experiências em minhas viagens revelaram que, independentemente das superficialidades que moldam a identidade de cada nação, no íntimo, todos anseiam por uma vida tranquila, a formação de uma família e o desejo de que seus filhos tenham um futuro melhor. Neste sentido, a busca por paz, dignidade na velhice e a aspiração por um legado de força e respeito às tradições revelam a essência comum que une as pessoas, transcende fronteiras e se manifesta em meio às diferenças aparentemente insuperáveis. Essa constatação é não apenas fascinante, mas também é um lembrete poderoso de que, em última análise, somos mais semelhantes do que diferentes.
BE – Você tem alguma dica para quem quer começar a viajar e explorar o mundo, de como se preparar para as experiências culturais que os destinos oferecem?
Zeca Camargo – Olha, essa é fácil, basta você viajar de olhos e braços abertos. Eu digo que você tem que se preparar, ler e ver reportagem de outras pessoas que já foram para esse país. Ao chegar, deixar toda essa informação no aeroporto e construir as suas histórias. Você verá coisas estranhas e também similares com a sua própria cultura, com outros países que você visitou e viajou. Mais do que se chocar ou evitar abraçar essas diferenças, você deve querer experienciá-las, querer vivê-las e isso vai só somar a sua experiência. Então viagem de olhos e braços abertos.
BE – Como você equilibra a vontade de explorar o mundo com a necessidade de contar essas histórias e conectar o público com diferentes culturas e realidades?
Zeca Camargo – Vivemos um momento fascinante da comunicação, no qual justamente as mensagens e ideias que queremos passar numa reportagem podem acontecer de múltiplas maneiras. Se você tiver talento para resumir tudo isso em até 90 segundos, você faz um tiktok, você faz um reels. Se você tem a paciência, a possibilidade e o tempo de escrever um livro, então, escreva um livro. Se você quiser fazer uma reportagem de televisão de 5, 6, 7 minutos, você vai fazer também. Se você quer fazer um grande podcast para soltar a sua narrativa, como eu já fiz inclusive, desses países, também pode fazer. Todas essas possibilidades são muitas ricas, são características dessa nossa época e eu fico muito feliz de poder usufruir de todas. Eu passei por tudo isso. Faço TV, podcasts, vídeocasts, entrevistas, escrevo livros e artigos. Quanto mais você puder explorar todas as mídias para levar essa experiência, essa multidiversidade, esse multiculturalismo, para as pessoas, seja o leitor, o ouvinte, o internauta, o espectador, tudo vale. Quanto mais opções você tiver, mais essa mensagem vai chegar e eu gosto de usufruir de todas elas.
BE – Voltando um pouco na sua experiência profissional, você também mantém uma carreira ativa no jornalismo cultural. Como você vê a evolução do jornalismo de entretenimento e a importância dele para o público atual?
Zeca Camargo – O jornalismo cultural sempre vai existir. Quando comecei a carreira, ficava um pouco em segundo plano, mas quando eu fui fazer a MTV, no início dos anos 90, vi a importância que ele tinha. Fazíamos um jornalismo na MTV que era basicamente sobre música e comportamento, que ganhou uma força enorme.
Em muitos casos, hoje em dia, em portais de notícia, a gente vê que a cobertura de entretenimento é muito forte, tem muita mais gente procurando essas informações para ficar sabendo o que está acontecendo e se divertir. A própria informação diluída e pulverizada, como é nas redes sociais, pede que a gente esteja constantemente se atualizando.
Eu fico muito orgulhoso de ter começado lá atrás um processo de valorização desse entretenimento cultural e o espaço que ela ganha hoje em dia, sobretudo com as redes sociais, tem que ser aproveitado. Vamos seguir falando sobre filmes, músicas, viagens, culturas e turismo, mas vamos fazer sempre com competência, com transparência, com honestidade e sem perder nunca a curiosidade por um novo filme, novo diretor, um novo cantor, uma nova música, uma nova novela, essas coisas todas. Se a gente conseguir manter a curiosidade para falar de entretenimento, acho que esse espaço só tende a crescer, aliás, é infinito.
BE – Quais são seus projetos atuais no jornalismo cultural?
Zeca Camargo – No momento não estou em nenhum programa de TV aberta, estou fazendo um projeto super legal sobre turismo na rede Times Brasil - Licenciado Exclusivo CNBC -, intitulado “Passaporte”, no qual exploramos destinos de alto luxo pelo mundo todo, aliado as informações de turismo e negócios que o canal CNBC Times Brasil é especializado.
Nas redes sociais e em vários outros veículos a gente está desenvolvendo projetos sempre ligados principalmente ao turismo e do turismo a gente puxa toda a cultura. Como gosto de viajar, realmente, o meu foco agora é esse. Ano passado eu fiz uma série sobre Paris com mais de 2 milhões de acesso em rede social. No final do ano, voltei a fazer isso em quatro capitais do Brasil: Aracaju, Recife, Maceió e Belém Também foi um sucesso, com mais de dois milhões de acessos. Vejo que a procura das pessoas é por essa informação leve que as redes sociais permitem e é nisso que eu estou apostando agora.
BE – Quais os planos futuros para a carreira?
Zeca Camargo – Em tom de brincadeira, mas cada vez um pouco mais sério, penso em me aposentar em dois ou três anos para poder viajar pelo resto do mundo. Menos com uma missão de divulgar experiências, mas sim de, realmente, usufruir de um tempo de lazer. Quando falo dessa ideia, amigos costumam responder: “Você não vai aguentar, sempre estará ativo”. Acredito que vou, de alguma maneira, estar fora das pressões de um trabalho regular. Para mim, é muito liberador e permite que eu possa planejar uma continuidade no que eu faço, mas sem tanto o compromisso com a divulgação, o que não vai obviamente mudar em nada a minha experiência de viajar, mas talvez o meu relacionamento com as pessoas. De qualquer maneira, acho que das redes sociais eu não saio nunca mais. Quem quiser continuar me acompanhando nisso, vai ter as redes sociais para explorar o mundo e para entender que estamos num mundo muito interessante e cheio de pessoas interessantes.
O relato dessas vivências, compilado em meu livro "A Fantástica Volta ao Mundo", não só me permitiu explorar em profundidade as emoções envolvidas, mas também compartilhar uma visão mais ampla sobre a necessidade de um mundo culturalmente diverso e vibrante, que respeite suas raízes e promova a recuperação dos patrimônios que ainda nos conectam ao passado