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Matilde Campilho: dicções múltiplas

Coluna | LiteraturaMatilde Campilho: dicções múltiplas

Sobre o autor

“Jóquei” é o livro de estreia da portuguesa Matilde Campilho (1982-). Publicado em 2014, em Portugal, ele ganhou destaque e recebeu edição brasileira já em 2015 pela Editora 34. Aliás, nesse mesmo ano, Campilho foi à FLIP e encantou leitores.

O sucesso da escritora, porém, antecede seu livro. Antes de ser publicada, a poesia de Campilho já acontecia com força nas redes sociais. Matilde postava seus poemas no Facebook e no YouTube. Ela os declamava e os mesclava com imagens, compondo videopoemas.

As postagens ganharam repercussão e chamaram a atenção da editora Tinta da China que então as editou. Até onde pude constatar, elas cessaram após a publicação do livro. Observo que Campilho lançou “Flecha”, em 2022, livro em prosa que ilustra os caminhos da escritora em meio aos gêneros e ao hibridismo

Os poemas de “Jóquei” fogem à convenção e muitos se esbarram na narração: “Na noite em que Billy Ray nasceu/ (rua 28, cruzamento com a 7, Nova Iorque) / não havia ninguém dedicado à contemplação dos gerânios. / Havia, isso sim, o som do mundo que caía /como estalactites múltiplas / sobre as cercanias do hospital”.

“Jóquei” traz, ainda, pequenos textos narrativos de enorme poeticidade: “Aqui é a beira da praia de Heak e ameaça chover há quatro horas. A umidade anda a cento e dez por cento. Ninguém se lembrou de colocar os laços em volta do pescoço dos pombos, mas apesar de tudo eles já circulam.”

Matilde Campilho tem como particularidade biográfica o fato de transitar entre Brasil e Portugal. Aliás, ela chegou a viver no Rio de Janeiro de 2010 a 2013 e é eventualmente chamada de escritora luso-carioca. O dado justifica uma espécie de mescla de dicções em sua poesia, que transita entre o português dos dois países.

Os 60 poemas de “Jóquei” mostram uma poética nômade. Com composições que apelam para o visual, poemas que misturam o português e inglês. Mesclam leituras, filmes, músicas. São trespassados por vozes diversas e citações diretas ou cifradas de poetas como Whitman, Drummond e Bob Dylan.

Com composições de grande força lírica, “Jóquei” mostra um pensamento em reconstrução. Um processo de (re)encantamento com um mundo fragmentado. Uma voz renovada em relação constante com a tradição literária. Destaco o poema “Príncipe no roseiral” (você pode ouvi-lo ao acessar o QR code ao final desta página). Trata-se de um metapoema que se perfaz enquanto negação de conteúdos que tradicionalmente ajudam a compor poemas: “escute lá / isto é um poema/ não fala de amor/ não fala de cachecóis / azuis sobre os ombros / do cantor que suspende / os calcanhares / na beira do rochedo” ou, mais a frente, “isto é um poema/ escute só/ não fala de santos / não fala de amor / não fala de Deus”.

JÓQUEI

Matilde Campilho

Editora: Editora 34

Páginas: 152 (2015)

Preço: R$ 29,44

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