SOBRE CÃES E GATOS
“Por que os seres humanos são tão fascinados por cães e gatos?” foi uma das 125 questões importantes para a compreensão do nosso mundo, listadas em publicação conjunta da revista Science com a Universidade de Xangai, em 2021. Tal fascínio decorre da domesticação de animais selvagens por nossos ancestrais, que selecionaram, ao longo de milênios, características que permitiram a convivência com os humanos.
Há cerca de 35 mil anos, iniciou-se no leste asiático um processo que resultou na domesticação do cão, o “melhor amigo do homem”. Admite-se que lobos menos arredios passaram a acompanhar grupos de caçadores-coletores em busca de sobras de alimentos. Os filhotes capturados que fossem mais mansos eram preservados e se reproduziam, e assim se estabelecia uma relação de benefício mútuo: os animais ajudavam na caça e, em troca, recebiam alimento e abrigo. Com a formação das comunidades agropastoris, há cerca de 11 mil anos, os cães mais fortes e habilidosos eram selecionados. Desse processo resultaram as 339 raças de cachorros; hoje, membros integrais da sociedade humana.
Já a domesticação dos gatos ocorreu ao mesmo tempo em que as sociedades agrícolas se desenvolveram no Oriente Próximo. A coexistência, instalada a partir da predação de roedores que infestavam os depósitos de grãos das aldeias pré-históricas - intensificada pelo seu uso em rituais religiosos no Egito Antigo por volta de 3.500 anos atrás - resultou na criação do gato doméstico. Como não sofreram mudanças tão acentuadas quanto os nossos cachorros, atualmente são reconhecidas apenas 40 raças desses felinos.
Hoje em dia, há entre 700 milhões e 1 bilhão de cães e entre 500 milhões e 600 milhões de gatos domésticos no mundo, grande parte deles vistos como integrantes do núcleo familiar. Esse fato fundamenta a inclusão da questão entre as 125 perguntas científicas relevantes.
E a fascinação é recíproca! Estudos indicam que os padrões de apego (cuidados, proteção e investimento emocional) entre animais de estimação e seus responsáveis são comparáveis. Ademais, as interações calmas e afetuosas entre eles promovem o bem-estar humano, fisiológico e psicológico, e têm o potencial de modular a secreção de dois neuro-hormônios: a oxitocina e o cortisol. O primeiro, o “hormônio do amor”, é associado à formação de vínculos entre pares e à regulação das emoções, enquanto o segundo é o “hormônio do estresse”. As pesquisas mostram que o aumento nos níveis de oxitocina reduz os níveis de cortisol, tanto nos tutores quanto nos 'pets', promovendo prazer, relaxamento, confiança e vantagens fisiológicas, como o fortalecimento das funções imunológicas e cardiovasculares. Uma vez que a redução dos níveis de cortisol atenua a ansiedade, a depressão e o estresse, infere-se que ocorram aumentos nos níveis de felicidade e companheirismo, e que os sentimentos de solidão entre os tutores sejam amenizados.
Por fim, estudos nessa área sustentam as terapias assistidas por animais e conduzidas por profissionais de saúde qualificados, que visam proporcionar benefícios terapêuticos e melhorar as capacidades físicas, sociais, emocionais e cognitivas dos seres humanos (Revisão em Frontiers in Psychology, 24/04/2024).