Desde menino, Rodrigo Capobianco Guido aprendeu a escutar o mundo — não apenas com os ouvidos, mas com a mente curiosa de quem busca decifrar o invisível.
Nomeado um dos 100 mil cientistas mais influentes do mundo pela Universidade de Stanford, ele desenvolve diversas pesquisas na área de processamentos digitais de sinais como: autentificação biométrica por voz, e patologias de voz.
Nascido em Adamantina, Guido se mudou com a família para Rio Preto quando tinha 6 anos. Com a curiosidade aguçada de um pesquisador, quando ganhou de seu pai uma placa eletrônica de uma TV antiga, começou a estudar o objeto e desde então não parou mais, criando um amor por eletrônica e processamento de sinais. Cursou duas graduações pela Instituto de Física de São Carlos (IFSC) e realizou um pós-doutorado em Engenharia Elétrica, e Física e Informática.
Rodrigo é casado com a dentista Daniela Denis Guido por quem também fez despertar a curiosidade no mundo da pesquisa. Com 27 anos de carreira, Rodrigo atua como professor titular de Engenharia Elétrica no Instituto de Biociências, Letras, e Ciências Exatas (IBILCE) em São José do Rio Preto.
Nesta entrevista, ele fala sobre a vida acadêmica, as conquistas, os desafios e a beleza de seguir curioso em um mundo que ainda tem tanto a ser descoberto. Confira:
BE - Como é conciliar a vida de pesquisador com a vida pessoal, sendo atualmente professor da UNESP em São José do Rio Preto?
Rodrigo Guido - A profissão exige dedicação permanente, muito além da sala de aula. Seja na Unesp ou no lar, afazeres inerentes ao trabalho como pesquisador exigem atenção e trabalho constantes. Desse modo, conciliar tudo nem sempre é tarefa elementar, mas o amor à família e à profissão acabam por se completar.
BE - Sua família tem interesse por ciência ou pela sua área de pesquisa?
Rodrigo Guido - Meus avós e meus pais são de famílias humildes e sem relação direta com a área científica. Minha esposa Daniela Denis Guido é dentista e, ao longo da nossa convivência, creio que consegui alimentar nela a paixão pela pesquisa, o que resultou na recente obtenção do Título de Mestre.
BE - Para começarmos, poderia comentar um pouco sobre sua trajetória acadêmica e destacar os pontos que considera mais importantes?
Rodrigo Guido - Quando ainda criança, papai me “presenteou” com uma placa eletrônica de uma TV antiga, obtida num ferro-velho. O circuito me aguçou profundamente a curiosidade investigativa e, desde então, nunca mais parei de estudar eletrônica e processamento de sinais. Cursei duas graduações, mestrado, doutorado, pós-doutorados, obtive o título de Livre-Docente e, recentemente, de Professor Titular. Tive a oportunidade de estudar na Unesp, na Unicamp, na USP, assim como na Escola de Engenharia de Lins e no Centro Universitário de Votuporanga. Todas as instituições auxiliaram na construção do que sou hoje. Neste contexto, destaco a importância das agências de fomento à pesquisa, particularmente a FAPESP e o CNPq, as quais foram fundamentais para possibilitar a viabilização de pesquisas diversas, de missões científicas no exterior, entre outras oportunidades.
BE - O que te motivou a se tornar cientista?
Rodrigo Guido - Posso dizer que foi a curiosidade investigativa, inerente ao amor pela pesquisa acadêmica, assim como o desejo de auxiliar e contribuir para o progresso da humanidade.
BE - Como foi receber o título de cientista mais influente de nossa região, uma vez que sua colocação é a mais alta entre os 10 pesquisadores citados.
Rodrigo Guido - É, certamente, uma imensa honra receber este reconhecimento e, ainda mais, uma notável responsabilidade. Entretanto, tenho consciência de que não sou superior a ninguém e o destaque em apreço constitui somente o resultado de significante e permanente esforço, o qual, sem dúvida, reflete também a dedicação de colegas, ex-professores, amigos e familiares que têm provido suporte e nunca desistiram de mim! O reconhecimento me dá mais motivação para prosseguir e, na verdade, me serve como “credencial” de serviço para manutenção do trabalho de pesquisa e de formação de recursos humanos que constituirão os pesquisadores das décadas vindouras.
BE - Qual foi a sua maior descoberta ou realização científica até agora?
Rodrigo Guido - Talvez os amigos leitores achem a resposta a esta indagação um tanto inesperada e não-técnica, mas, de fato, posso afirmar que minha maior descoberta é que, na verdade, apesar dos largos passos da ciência atual, muito pouco sabemos sobre os fenômenos da vida e do universo na totalidade. Assim, creio ser esta a minha maior descoberta ou “conclusão”. Quanto mais descobrimos, mais constatamos a nossa pequenez.
BE - Sua pesquisa mais recente envolve o processamento de sinais de voz. Qual foi o maior desafio durante este estudo?
Rodrigo Guido - Creio que os principais desafios envolvem a obtenção dos dados necessários para as pesquisas, principalmente quando elas são de cunho biomédico, ao existir a necessidade de laudos de parceiros médicos, rotinas para diagnósticos, entre outros detalhes.
BE - Como você sabe que uma descoberta é relevante?
Rodrigo Guido - Em princípio, quaisquer resultados fundamentados em boas práticas científicas têm importância dentro de um determinado contexto. Entretanto, de modo geral, acredito que uma descoberta é relevante quando, contribuindo para o estado-da-arte em determinada área, possui o potencial para resolver um problema de interesse e que pode ser aplicado, de algum modo, para o progresso da humanidade.
BE - Qual a parte mais difícil da sua profissão?
Rodrigo Guido - Uma dificuldade marcante tem sido os recursos para financiamento de pesquisas. Nesse sentido, destaco não somente os recursos diretos para compra de equipamentos, por exemplo, mas também auxílios para que os estudantes de iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutorado tenham condições de permanência e dedicação ao integrar um grupo de pesquisas. De fato, é necessário que as bolsas de pesquisa tenham condições competitivas com os valores pagos no mercado, principalmente em áreas como a de tecnologia, para as quais a demanda em âmbito externo ao acadêmico é enorme.
BE - Quanto tempo, em média, leva uma pesquisa em sua área?
Rodrigo Guido - Depende muito dos objetivos específicos e do nível da pesquisa. As que envolvem descobertas e contribuições maiores podem necessitar de vários anos para estarem “maduras” e com potencial para caracterizar uma contribuição relevante.
BE - Qual a dificuldade para conseguir investimento para pesquisas, principalmente realizadas na nossa cidade?
Rodrigo Guido - A dificuldade é, sim, significativa. As agências de fomento têm estado sobrecarregadas e não possuem capacidade para atender integralmente ao conjunto de demandas. Particularmente em nossa cidade e região, creio que temos tido algum movimento no sentido de estabelecer parcerias acadêmico-industriais, tais como as que existem entre as universidades e o setor privado, mas maior engajamento do setor privado, assim como ocorre em outros países, é certamente necessário.
BE - Atualmente, como Professor Titular na UNESP, você acha que a falta de empregos no setor de pesquisa no Brasil influencia os cientistas a procurarem trabalho em outras áreas?
Rodrigo Guido - Sim, temos assistido a uma redução na permanência acadêmica no Brasil, principalmente em áreas nas quais a demanda no setor privado e industrial é crescente, tal como ocorre nas subáreas de engenharia e de tecnologia da informação. Entretanto, é necessário registrar que a remuneração não é tudo. Quando estamos no início da carreira, buscamos retorno financeiro, entretanto, adiante, percebemos que amor ao trabalho, a vida equilibrada e a paz interior, os quais contribuem para o aprimoramento do nosso propósito maior de vida, valem mais.
BE - Na sua opinião, o que falta para a ciência ser mais valorizada na visão daqueles que não são estudantes ou profissionais da área?
Rodrigo Guido - Primeiramente, compreender que, sem a ciência, provavelmente nem estaríamos aqui! Quer exemplo melhor do que os recursos científicos que conduziram à produção das vacinas para a recente pandemia da COVID-19? Sem a ciência e os pesquisadores para impulsioná-la, o que teria sido de nós? Além disso, é necessário entender que atuar como pesquisador exige enorme responsabilidade pelo fato de que as descobertas, mesmo que modestas num primeiro momento, podem, em pouco tempo, alterar os rumos da humanidade. Se hoje dispomos de eletricidade, telefones celulares, Internet, tomografia computadorizada, ressonância magnética, medicamentos, entre outros, o mérito é daqueles que, na condição de pesquisadores sérios, fizeram o seu papel como cientistas, apesar das inúmeras dificuldades que enfrentaram.
BE - Que áreas da ciência você acha que terão mais impacto/importância no futuro?
Rodrigo Guido - Aquelas relacionadas às tecnologias envolvendo inteligência artificial, energia e as que focam em saúde: diagnóstico e tratamento de precisão, essencialmente.
BE - Poderia deixar um conselho para quem deseja seguir na profissão?
Rodrigo Guido - Persistência, humildade e merecimento andam de mãos dadas! Nunca desistir de um sonho, jamais se envaidecer e compreender que as recompensas e o reconhecimento virão como consequências naturais. Não buscar fama, jamais! Fama passa, posições passam, mas o caráter e as boas obras permanecem! Seremos lembrados não por momentos de fama, mas sim pela diferença que fizemos na vida das pessoas.
(Colaborou Gabriela Costa)
