Paulina Chiziane (1955-) é uma das maiores escritoras de Moçambique. De origem humilde, ela nasceu e cresceu em um momento muito importante da história de seu país, a guerra contra a colonização e a independência de Portugal, em 1975.
“Balada de amor ao vento”, publicado originalmente em 1990, a tornou a primeira mulher a publicar um romance após a emancipação do país.
Figura de crucial importância no que diz respeito à voz feminina de Moçambique, Chiziane se define como uma contadora de histórias, e não uma romancista. De fato, sua narrativa tem algo da tradição oral, daquele narrador que Walter Benjamim dizia se basear na experiência compartilhada e que se integra a uma memória coletiva.
“Balada de amor ao vento” traz a história de Sarnau, a principal narradora da história. Ela mora em Mafalala, um dos bairros mais famosos de Maputo, associado à emergência da identidade moçambicana. É desse espaço que ela narra em flashback: “Estou envelhecida e sinto a aproximação do fim da minha jornada, mas o passado desfila como um rosário de recordações (...)”.
O ponto central de suas memórias é o envolvimento amoroso com Mwando. Um amor vivido em meio à tradição poligâmica de Moçambique, do qual a família da jovem fazia parte, e a cristianização do país que trazia a monogamia, a que a família de Mwando aderia.
Na juventude, Mwando, que se diz apaixonado por Sarnau, a deixa para se casar com uma cristã. Tempos depois, Sarnau se casa com o rei local. Por ser a primeira esposa, ela conta com regalias. À medida que o rei soma novas mulheres, porém, sua vida é invadida pela inveja e pelas intrigas.
Ela está decepcionada e infeliz quando Mwando reaparece. Segura de que é ele o amor de sua vida, ela trai o rei e acaba tendo que fugir com o amante após o envolvimento ser descoberto pelo marido.
Premido pela situação de penúria e pelo medo da perseguição, Mwando a abandonará, mais uma vez. Retornará 15 anos depois, encontrando Sarnau doente e tendo passado por sofrimentos e humilhações para criar a filha da qual estava grávida quando ele a deixou.
A história parece melodramática, mas não é. Ela tem algo da sabedoria das histórias de cunho moral. Daqueles casos passados de geração em geração.
A vida de Sarnau está sujeita ao abandono, à violência e à solidão. Apesar do retorno de Mwando ao final, não há qualquer resquício de “felizes para sempre” em sua história. Pelo contrário. Trata-se do convite para uma viagem terrível: “Quem já viajou no mundo da mulher? Quem ainda não foi, que vá.” O alerta para uma realidade dolorosa para muitas mulheres: “o lar é um pilão e a mulher o cereal. Como o milho serás amassada, triturada, torturada, para fazer a felicidade da família. Como o milho suporta tudo, pois esse é o preço da tua honra”. Leitura muito interessante!
