Qual é a sua tarefa mais urgente para hoje?
Essa é uma das perguntas que ressoam na nossa mente ao final da leitura de “A lista”, da escritora canadense Jeniffer Tremblay (1973-).
Escrito para o teatro, “A lista” é um texto curto e intenso. Pode ser lido em poucas horas. De ritmo grave e forte, ele nos traz uma constatação desconfortável e necessária. A de que estamos vivos, porém consumidos e exaustos.
São as múltiplas tarefas do cotidiano que por vezes nos desnorteiam e fazem com que nos percamos em meio aos deveres primordiais conosco e para com os outros. E fazem com que nos reconheçamos na narradora e nas demais personagens da história.
“A lista” tem como protagonista uma dona de casa residente em um vilarejo canadense. Com três filhos pequenos e assoberbada pelos afazeres e obrigações que consomem seus dias, ela tenta se organizar em meio a listas que busquem ajudá-la na organização de suas tarefas: “Mantenho uma lista cerrada. / Detalhada. / Sigo essa lista”.
Caroline é sua vizinha e amiga, uma mulher com quem compartilha a similaridade do cotidiano. A diferença é que Caroline engravida do quinto filho, o que lhe traz algo como um espanto agressivo: “Ela me desespera. Essa mulher merece uma surra. / Há limite. / Chega.”
A justificativa de Caroline: “Gosto da facilidade de se amar os filhos” aponta para a necessidade da espontaneidade gratuita do amor, ao mesmo tempo em que deixa ver a dificuldade contemporânea em se cultivar o sentimento em meio aos fatos do todo dia que nos premem sem dó ou piedade.
A grande questão que a história nos traz é que a narradora, em meio às muitas listas que elabora, acaba negligenciando coisas. Muito embora mantenha uma “lista cerrada”, ela se perde em meio aos itens. E uma das tarefas não cumpridas trará uma consequência desastrosa que envolve sua amiga e vizinha.
“Eu não considerei corretamente essa tarefa. Eu devia tê-la considerado de imediato. Sem dúvida. Era urgente. Eu a considerei uma tarefa flutuante. Eu a reescrevia de uma tarefa à outra. Às vezes nem reescrevia. Eu a achava numa lista antiga. Isso me lembrava que eu tinha prometido. E eu a copiava novamente. Eu anotei essa tarefa durante meses”.
A impossibilidade de desfazer sua negligência traz à sua história teor trágico. Não há como remediar a situação. O que está feito está feito. O que não está também. É impossível refazer o caminho. Remediar a situação.
Em meio ao cansaço dos nossos dias, à nossa corrida insana muitas vezes para lugar algum, ficam algumas perguntas ao final de “A lista”: quais são as nossas prioridades? Qual é o meu dever com relação ao outro? O que deve ser privilegiado, afinal de contas?
Texto surpreendente. Denso e provocativo. Muito interessante!
