São tantas as situações vivenciadas ao longo de uma vida de trabalho na área da educação, exercendo as mais diferentes funções e ocupando diferentes cargos que, escolher algumas situações ou contextos para comentar, nem sempre é fácil. De todo modo, nesses anos todos, fui sempre uma “eterna aprendiz”.
Aprendi com meus colegas de trabalho, com os professores, com os diretores, com os pais de alunos e com meus superiores que a hora e a vez devem ser sempre do aluno... Hoje agradeço a todos eles.
Percebi que quanto mais de periferia for uma escola, quanto mais dificuldades têm os alunos, mais bonita, colorida, motivadora, estimulante, desafiadora, rica em tecnologia, em recursos didáticos e pedagógicos... tem que ser a escola. Parece óbvio, mas nem sempre era o que via.
Na minha primeira reunião de diretores ouvi da dirigente de ensino que o sucesso ou o fracasso da escola estava nas mãos do diretor de escola. Fiquei indignada. Como?!!! Não é possível... São tantas as variantes! Com o passar do tempo percebi que ela estava com a razão.
Lembranças tenho muitas, mas vou citar apenas algumas para nos fazer sorrir ou mesmo ver quão distante estava da realidade.
Lembro-me da mãe que chegou nervosa à diretoria de ensino dizendo que só porque o filho tentou pôr fogo na classe, mas não conseguiu, a diretora queria transferi-lo para outra escola.
— Olhe, disse ela, trouxe até um pedaço da carteira que ele queimou. Só queimou esse pedaço, agora querer transferir meu filho só por isso, está errado.
De repente, em pleno jornal do meio-dia da televisão, você é surpreendida com a repórter entrevistando um aluno, na escola, perguntando quanto era 7×4 e o aluno, do sétimo ano, não sabendo responder. Ao lado, a professora e a diretora, que permitiram a filmagem, mostravam-se horrorizadas. Ao questionar a diretora se não era o dever da escola ensinar e não chamar a televisão, você é tida como alguém que não reconhece o trabalho da escola.
Recordo-me de pais que vinham à diretoria, com os filhos, dizendo que, como eles estavam indo mal na escola privada, queriam castigá-los e colocá-los na escola pública. E pediam para eu indicar a escola...
E a sensibilidade daquela professora que ao ver a criança dormindo em sala de aula, não permitiu que ninguém a acordasse, pois ninguém sabia como tinha sido a noite dela.
Aprendi com a delicadeza de colegas capacitadores que, diante de perguntas de professores que demonstravam ignorância total de aspectos da própria matéria que lecionavam, respondiam elogiando a pergunta feita e davam uma verdadeira aula. Para quem era do paradigma do “bateu, levou”... ficava de queixo caído com a fineza do colega.
Lembro-me de um colega diretor de escola que me alertou para que eu estava estimulando os alunos a serem dedos-duros, pois queria que eles dissessem quem tinha estourado as caixas de som do laboratório de línguas da escola em que atuava.
Também me recordo da satisfação de diretores que relatavam o agradecimento de pais por verem os filhos participando de ações comunitárias e de projetos de melhoria do próprio bairro, por participarem do grêmio estudantil, por terem se preocupado com a aprendizagem dos filhos e trabalhado para que os filhos e a própria comunidade se vissem como sujeitos de direitos!
Ao longo dos anos, percebo o quanto amadureci e o quão importante foram esses anos todos, não só na minha visão de mundo, mas na minha própria atuação neste campo tão denso e complexo como é o da educação.
Leila Kerbauy
Mestre em Educação pela Unesp de Marília. Ex-dirigente e supervisora de ensino. Atuou como professora da educação básica e do ensino superior