Viajar vai muito além de acumular fotos bonitas ou cumprir roteiros turísticos. A mudança de cenário, o encontro com o diferente e até os desafios enfrentados longe de casa têm impacto direto na saúde mental e emocional. Em tempos de rotinas aceleradas e altos níveis de estresse, o deslocamento físico acaba se tornando também um movimento interno, capaz de provocar reflexões, ampliar percepções e ressignificar valores.
Do ponto de vista psicológico, os benefícios são amplamente reconhecidos. Segundo a psicóloga cognitivo-comportamental Alana Lin, a experiência de viajar atua diretamente no bem-estar emocional. “Viajar nos permite reduzir o estresse e promover o relaxamento devido à mudança de cenário, quebra da rotina. Poder conhecer novos lugares e culturas, ter novas experiências, superar desafios com a língua, desenvolver habilidades para lidar com a adaptação ao ambiente promove melhoria do humor, redução do estresse e consequentemente o aumento de dopamina, aumento da autoestima, além de proporcionar a criação de excelentes memórias”.
Esse contato com o novo também estimula processos profundos de autoconhecimento. “Conhecer diferentes formas de viver, pensar nos convida a questionar e reavaliar as próprias crenças, aumentar a perspectiva em relação à resolução de problemas, repensar e pensar de forma diferente, expandir o repertório cognitivo e emocional com a mudança de cenário e experimentar novas emoções em ambientes diferentes dos quais estamos acostumados”, afirma a psicóloga.
Na prática, essas transformações aparecem de formas muito concretas. A professora de matemática Isabel Naime relata que suas viagens sempre foram uma forma de se reconectar consigo mesma. Planejando cada roteiro com cuidado, ela busca conhecer tanto os cartões-postais quanto a vida cotidiana dos destinos. Em Dubai, por exemplo, fez questão de visitar não apenas a arquitetura moderna, mas também a parte antiga da cidade, menos explorada pelos turistas.
A experiência mais marcante de sua trajetória foi em 2023, quando viajou sozinha para o Egito e Dubai. Apesar de estudar previamente a cultura e respeitar os costumes locais, Isabel se deparou com situações difíceis por ser mulher viajando sozinha, especialmente no Egito. Desde o desembarque no aeroporto até a circulação pelas ruas, o choque cultural foi intenso, revelando um cotidiano predominantemente masculino e regras sociais rígidas em relação ao comportamento feminino.
O contato direto com a religiosidade muçulmana foi um dos pontos que mais a impactaram. A disciplina da fé, expressa nas orações diárias, no jejum do Ramadã e na forma como a espiritualidade está integrada à rotina, trouxe reflexões profundas. “A fé em Deus com certeza é a maior lição que carrego desses lugares”, resume. Apesar das dificuldades iniciais, Isabel se encantou com as paisagens, como o Mar Vermelho, e afirma que a experiência a fez valorizar ainda mais seus princípios, seu país e o respeito às diferenças culturais e religiosas.
Para o empresário Alexandre Alupoli, as viagens que mais transformam nem sempre são as mais distantes ou socialmente valorizadas. Embora reconheça o impacto de conhecer a Europa e o chamado “velho mundo”, repleto de referências históricas e culturais, a lembrança mais marcante de sua vida vem de uma viagem simples em família pelo sul do Brasil, ainda na juventude.
A memória afetiva de estradas, serras, rios e momentos compartilhados com os pais e a irmã permanece viva como símbolo de conexão e pertencimento. Para ele, esse tipo de vivência ajuda a entender o que realmente importa: o tempo de qualidade, as experiências genuínas e as emoções que ficam, independentemente do destino.
Com o passar dos anos, Alupoli percebeu uma mudança clara em sua forma de viajar. Hoje, prioriza roteiros mais leves, flexíveis e menos engessados por listas de obrigações. Perder-se por ruas, vielas, praias ou simplesmente deixar a viagem acontecer se tornou parte essencial do processo.
Mais do que mostrar onde está, ele busca sentir onde está. “É fazer com que essa viagem seja mais de conexão e menos de demonstração”, define. Para Alupoli, o verdadeiro valor da viagem está no que fica guardado por dentro, lembranças, sensações e aprendizados que seguem acompanhando a vida muito depois do retorno para casa.

